03 janeiro 2008

Programa "Novas Oportunidades"

Assim, aparentemente, aquilo a que estamos a assistir é à criação de uma sociedade fortemente dual, constituída por uma minoria de pessoas bens formadas e dotadas de razoáveis recursos económicos, que auferem das maravilhas tecnológicas, sociais e culturais que o Estado (em sentido amplo) tem vindo a produzir, e uma imensa maioria de pessoas mal instrumentadas e com recursos económicos escassos, para quem aquilo que se passa nas universidades e nos centros culturais e tecnológicos lhes escapa completamente, sendo que quanto mais desenvolvida é a cultura e a tecnologia e mais escasso o emprego mais a dualidade social se acentua.

À escola compete, idealmente, a tarefa de rompimento deste ciclo de reprodução social. No entanto, e como se vê, o que a escola tem vindo a fazer tem sido exactamente o contrário, isto é, a optimização deste dualismo social, que leva a que os alunos mais pobres e menos instrumentados educacional e culturalmente se vejam quase sempre na cauda da progressão social.

Neste contexto, é impossível não assinalar a enorme relevância do programa Novas Oportunidades, que pretende reconhecer e validar as competências técnicas e sociais de um milhão de cidadãos até 2010, envolvendo enormes recursos financeiros, através de estratégias pedagógicas activas e dinâmicas, no sentido em que buscam o envolvimento emocional, cívico e pessoal dos formandos, visando colmatar as suas falhas formativas. Na verdade, o défice formativo de Portugal é tão grande relativamente aos seus parceiros europeus que sem uma estratégia formativa profundamente voluntarista e proactiva seria impossível, num prazo razoável, colmatar esse défice.

Francisco Teixeira (aconselho a leitura integral do seu texto aqui.)


Na minha opinião louvo a iniciativa do actual Governo no que ao Programa das "Novas Oportunidades" diz respeito. É uma forma de os nossos cidadãos menos escolarizados prosseguirem os seus estudos e, ao mesmo tempo, emanciparem-se a vários níveis: pessoal, cívica, social, económica, culturalmente.
Não se pode, todavia, correr o risco deste programa caír no erro da desigualdade de oportunidades e legitimar o que vem sucedendo na educação em Portugal: os alunos mais pobres e menos instrumentados educacional e culturalmente se vejam quase sempre na cauda da progressão social.

3 comentários:

Na Cónega disse...

Programa 'Novas Tretas'... funciona tudo na mesma... igualdade de oportunidades para as cunhas que entram nos locais de recolha das candidaturas... complica-se o processo de um, facilita-se o processo de outro e, no final, o pobre mas competente picheleiro que quer concluir o 12.º ano fica para atrás enquanto o sobrinho do primo do director da escola, que até é um malandro, fica com a vaga...
Novas oportunidades, Velhos hábitos...

Anónimo disse...

Francisco Teixeira fala de um problema como o défice de educação como se fosse algo colmatável ou extremamente sensível à escolha política. Aumento dos níveis de educação? Sim! Falseamento? Não! O mais importante é, antes de tudo, incutir uma mentalidade que confira um espaço previlegiado à educação.
Sabemos bem que a educação, especialmente entre as classes operárias, é uma preocupação recente, ou, se quiserem, "um bem de quarta geração". A pobreza das classes operárias, assim como o enorme fosso entre ricos e pobres (quem nunca ouviu falar na "terra dos Ferraris"!) foram sempre uma imagem de marca do Vale do Ave. Vale a pena atribuir esta situação ao Estado Novo? De facto, o Estado Novo estabeleceu como programa ideológico a manutenção na "pobreza intelectual" das classes baixas. Mas não será um problema ainda anterior? Melhor, não será um problema actual? Quantos de nós não experienciaram no seu quotidiano o odor fétido das frases feitas da populaça sobre a educação superior? Exs: "gastar o dinheiro aos pais", "estudar para burro", "passear livros", entre outros... Enquanto vingar a ideia da desprezabilidade da educação não teremos avanços reais.
Portugal entra para a UE em 1986. Rapidamente se compreende que uma das razões do subdesenvolvimento e pobreza crónicos se devem ao baixo índice de desenvolvimento humano. Criam-se fundos e transferem-se verbas. As empresas compram Ferraris com essas verbas. A fiscalização do seu retorno é inexistente. Mentalidade empresarial? Zero!
Portugal precisa sair urgentemente da cauda da Europa em termos de escolaridade. Como? O Governo Cavaquista liberaliza. As universidades privadas e politécnicos surgem como cogumelos. O catedrático torna-se uma espécie mais procurada que o rinoceronte branco. Oferece-se o 9º ano e o 12º a quem não tem. Estamos realmente a avançar ou trabalhar para a estatística?

Helena Antunes disse...

Partilho das vossas ideias e preocupações.

Caro Luciano, tenho de concordar consigo quando diz que que a educação, mais concretamente o ensino superior, é uma preocupação recente das classes operárias. E, concordo ainda, que tal não é um problema que remete somente ao Estado Novo, continunado a ser um problema actual. Conheço casos de indivíduos que não incentivam os seus filhos a prosseguirem os estudos, vêem o ensino como aborrecido e desinteressante. Se os filhos forem trabalhar mais cedo para serem fonte de rendimento lá para casa, tanto melhor.
É este tipo de mentalidades que temos de mudar. A educação é um bem essencial. O Luciano diz muito bem: "Enquanto vingar a ideia da desprezabilidade da educação não teremos avanços reais."

Depois, a política governativa no que concerne à educação é discriminatória. Apesar dos esforços empreendidos, o filho do médico, do juíz, do professor continua a ser favorecido na Escola e é a eles que estão reservados os melhores lugares. Vejamos a importância dada às escolas privadas em deterimento das públicas. Os alunos das escolas privadas são sempre considerados mais inteligentes que os das escolas públicas. Será?? Só porque pagam muito dinheiro para lá andar? Porque "compram as notas"?
Enquanto houver esta legimitação da norma estabelecida, do status quo, não vamos conseguir caminhar para a igualdade de oportunidades.

Cumprimentos a ambos.

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