18 novembro 2007

A Desertificação: Um Problema Social

Cinco anos após a inauguração da nova aldeia da Luz, no concelho de Mourão, o presidente da junta assegura que "muitas casas e terrenos" ainda não estão registados em nome dos moradores e estes queixam-se também da persistência de velhos problemas.

"O Alqueva não trouxe nada, nem bom nem mau. No início, fizeram isto muito fácil, há-de haver barragem, turismo, fábricas, muita gente. Olhe, não aparece aqui ninguém e as casas estão todas imperfeitas", sentencia, à agência Lusa, Rosa Falé, prestes a cumprir 71 anos. Numa ponta da rua da Estrela, onde mora, a idosa faz o balanço dos últimos cinco anos na aldeia que a viu nascer e criar, mas que já não é a sua "velhinha" Luz, desmantelada e submersa pelas águas de Alqueva.

Notícia: JN


Sobre a desertificação já eu tinha falado no Avenida Central.

Infelizmente,a desertificação de certas terras ou regiões e o descontentamento das suas gentes não acontece só por terras transmontanas. Não esqueçamos que o Alentejo é uma província que também padece de desertificação, onde os seus habitantes sentem que são depositados ao abandono, sítios onde parece que o desenvolvimento ainda não chegou e onde assistimos a situações de pobreza, de desânimo das suas populações. Ainda me recordo de há uns anos quando regressava de férias do Algarve, parar e visitar terras alentejanas como Barrancos, Aldeia da Luz onde subsistiam relações de vizinhança, onde seus habitantes demonstravam descontentamento por serem colocados ao desprezo. Estivemos, sobretudo, à conversa com habitantes da nova Aldeia da Luz onde eles nos mostraram o seu descontentamento por não verem satisfeitas algumas das suas exigências e vontades aquando da mudança. E a única diferença que eu via da velha para a nova Aldeia da Luz foi precisamente as habitações. De resto, tudo igual: desertificação daqueles lugares, maioritariamente idosos, mentalidades esquecidas e desvalorizadas.O desenvolvimento sócio-económico precisa urgentemente de chegar a estas terras e suas populações para que deixemos de assistir a uma desertificação do interior em favor de um cada vez maior urbanismo desordenado que afecta as regiões do Litoral.

Vejamos grandes cidades como Lisboa e Porto onde nos seus grandes centros encontramos graves contrastes de lojas luxuosas no rés-do-chão em oposição com os andares habitacionais cada vez mais degradantes. Cidades ricas e luxuosas, com um elevado nível de vida e ao mesmo tempo "bairros de lata" cheios de indíviduos de diferentes raças e minorias étnicas e culturais colocadas ao abandono e à degradação económica e social.

E, mesmo dentro da região Litoral, não raro assistirmos a freguesias paradas no tempo, por assim dizer. Assistimos nos nossos concelhos a terras também elas deitadas ao abandono, onde parece que só interessam as cidades-concelho e todas as suas freguesias ficam pobremente esquecidas.Recordo há dois anos quando andei em campanha para as autárquicas em algumas freguesias do concelho de Santo Tirso, vi pessoas e sítios abandonados, com ruas estreitas e sem pavimentação, degradadas ao ponto de nem sequer uma ambulância conseguir lá passar numa possível situação de emergência.Falo também aqui de lugares que nos são tão próximos e para os quais os agentes autárquicos não parecem minimamente preocupados. Por exemplo, no concelho de Guimarães proliferam as ditas freguesias paradas no tempo, onde o desenvolvimento parece que ainda não chegou, onde as mentalidades dos seus habitantes parecem retrógadas. Falo, por exemplo, da freguesia onde mora grande parte da minha família paterna. Conheço Serzedelo desde que nasci e em 24 anos da minha existência não consigo ver nada de novo, nada que tenha evoluído naquela terra. Continuam a persistir as relações de vizinhana onde todos sabem de tudo de todos; só se vêm casas e um cafezito aqui e acolá e mais nada, mais nada mesmo; as mentalidades das pessoas não evoluiram, as pessoas continuam a ter baixa escolaridade, as jovens casam ainda adolescentes ou em início de fase adulta porque já estão grávidas; terras onde a informção não chega; são terras pequenas, onde o tranporte público parece que não chega; sem pavimentação. Há uns meses passei por uma freguesia do concelho de Guimarães que ainda consegue ser pior. É Airão, onde também só se vêm casas, ruas estreitas, sem passeios. Onde as pessoas se encontram nos raros cafés da esquina, onde o desenvolvimento não chegará tão cedo. E eu pergunto, que Guimarães é este que será capital europeia da cultura? Onde está a gestão autárquica que só se preocupa com a cidade e deixa ao abandono as suas freguesias paradas no tempo? Porque não fazem chegar às suas populações as condições minímas e necessárias de existência?

Porque continuam todas estas realidades ocultas e deixadas ao esquecimento e nada se faz???

8 comentários:

J Francisco Saraiva de Sousa disse...

É sempre bom relembrar a desertificação dos centros das cidades, tais como Lisboa e Porto. No Porto, começamos a detectar vontade política para mudar a situação, através da requalificação da Baixa e a contrução de grandes empreendimentos que obrigam a alterar o enquadramento.
Abraço

Helena Antunes disse...

Boa iniciativa essa da Câmara Municipal do Porto.

Temos de combater os contrastes agravantes dos centros urbanos, diminuindo o número de pessoas em locais de grande densidade populacional e transferi-los para zonas que estão desertificadas. Mas é claro que têm de ser criadas as mínimas condições de habitação e vivência social.

Sónia Monteiro disse...

Citando:
"Por exemplo, no concelho de Guimarães proliferam as ditas freguesias paradas no tempo, onde o desenvolvimento parece que ainda não chegou, onde as mentalidades dos seus habitantes parecem retrógadas.(...)É Airão, onde também só se vêm casas, ruas estreitas, sem passeios. Onde as pessoas se encontram nos raros cafés da esquina, onde o desenvolvimento não chegará tão cedo."

Cara Helena,
é de louvar a tua preocupação pelo desenvolvimento diminuído nos nossos coneselhos.

No entanto, permite-me discordar do que escreveste, sobretudo, em determinados pontos.

E discordo com conhecimento de causa. Conheço bastante bem e resido numa dessas freguesias que aqui descreves.

De facto, Airão tem muitos frutos para dar e precisa de apostar em determinadas políticas de crescimento e desenvolvimento.

Quanto às vias públicas a que te referes, as coisas não podem ser generalizadas. Infelizmente, nem sempre há condições para a construção dos referidos passeios. E a via principal daquela freguesia não oferece essas condições, dado que as inúmeras construções privadas que aí existem encontram-se muito próximas da via pública e já existem há anos.
Já no que toca às outras vias interiores, lamento discordar. Percorri muitas vezes essas ruas a pé e, atendendo ao meu conceito de "estreito" e "apertado", não parece ser o caso.

Quanto às mentalidades, parece um comentário que revela um desconhecimento da realidade em causa. Aliás, um tanto ofensivo, escusado, precipitado e provinciano
Podes encontrar essas mentalidades em qualquer sítio. Quer em Freixo de Espada à Cinta, quer na Rua Augusta em Lisboa.
Especular que quem vive numa aldeia é retrógrado , parece-me revelador de um profundo desconhecimento social e de uma certa pseudo-superioridade citadina.

Para uma freguesia como Airão, com relativa densidade populacional, os cafés existentes, bem como restaurantes revelam uma oferta maior que a procura. Mas também não é o número de cafés que consubstancia um indicador credível do índice de desenvolvimento, não é verdade?

Quanto aos jovens, são bastantes para a freguesia em causa, basta ver as salas de aulas na Primária ou na Catequese.
Para não falar dos jovens que frequentam cursos superiores ou técnico-profissionais...

Muito mais podia aqui ser dito por alguém que vive nessa freguesia há mais de vinte anos e conhece realmente quais são os problemas de facto que a freguesia enfrenta. E infelizmente são muitos mas não correspondem aos que aqui escreveu.

Conhece mesmo Airão?

Uma opinião pessoal, a realidade de nosso país é pautada por diferenças geográficas, culturais, entre outras. Aniquilar essas diferenças é "matar" a nossa identidade.
Há cidades, vilas e aldeias cada uma com as suas características.

Cumprimentos e com um convite a visitar Airão e conhecer exactamente o que há e o que faz falta nessa freguesia.

Helena Antunes disse...

Olá Sónia!

Devo admitir que o teu comentário aqui se revela em grande parte pertinente, dado que apresentas um pouco da realidade que se vive em Airão. Como disse no post estive em Airão apenas de passagem, posso dizer-te mais concretamente que estive lá no dia de Páscoa a almoçar com a minha família paterna.
Já relativamente a Serzedelo falei mais porque de facto conheço esta terra desde que nasci e não vejo qualquer tipo de crescimento nem de desenvolvimento. Conheço Serzedelo desde que nasci e em todos estes anos quase nada mudou. Muitas vezes comparo com a terra na qual vivo e da qual sou natural, Vila das Aves, e esta última cresceu muito e muito nos últimos anos, a todos os níveis.
Por exemplo, falas da quantidade de jovens qua andam no 1º Ciclo que são muitos, pressuponho que tal como Serzedelo possui apenas escolas de 1º Ciclo e não têm escola de 2º e 3º Ciclo, nem escola secundária. Por exemplo, os meus primos de Serzedelo a partir do 5º ano tinham de deslocar-se para Riba d'Ave para o Externato Delfim Ferreira ou para a Didaxis para prosseguirem os estudos. Eu em Vila das Aves, só saí daqui para ir para a Universidade.
Terá Airão muitos jovens da tua idade e idade superior, ou haverá uma fuga desses para locais, nomedamente as cidades, onde lhes oferecem mais oprtunidades de trabalho, habitação, cultura e lazer, desporto, etc?
Com relativa densidade populacional, isso significa mais ou menos quantas pessoas?

E depois, eu não falo que determinado indivíduo é retrógrado, falo sim numa mentalidade colectiva que é retrógrada. Digo isto não num sentido negativo nem discriminatório, mas sim num sentido de que grande parte destas pessoas não acompanharam a mudança de valores imposta pela sociedade, imposta pela mudança rápida que se nos impôs. A mudança quer-se gradual para que mais ou menos toda a gente a possa acompanhar e adaptar-se, mas temos vindo a assistir a uma mudança brusca de valores e comportamentos que a muitas pessoas não foi possível nem está ser possível acompanhar.
Vejo esse tipo de mentalidades em freguesias de Guimarães, em freguesias de Santo Tirso como também foquei, e em muitas outras freguesias de outros concelhos.
Não tenho nada contra Guimarães, antes pelo contrário, adoro a cidade, sempre a frequentei desde miúda visto o meu pai ser de Guimarães, tenho um grande afecto por Guimarães. E confesso-te que gosto muito mais de Guimarães que Santo Tirso.

Já que falamos em Santo Tirso, no último ranking de desenvolvimento municipal, ficamos na posição 306 em 308 concelhos, atrás de nós somente dois concelhos algarvios. É uma vergonha para Santo Tirso, sobretudo tendo em conta que fica a Litoral, distrito do Porto, considerada uma zona desenvolvida.
Contudo, posso orgulhar-me de viver numa freguesia que está muito desenvolvida e que cresceu e se desenvolveu muito nos últimos anos. Vila das Aves comparada com muitas vilas, poderia ser cidade ou até mesmo concelho. Partiu muito da mobilização dos seus habitantes. Não vou aqui enumerar-te tudo o que temos para não me alongar, mas também estás convidada a paasar por cá e com muito gosto apresentarei a minha terra.
Quanto à pseudo-superioridade citadinda de que me acusas não a tenho, eu também não sou da cidade, moro numa vila. Como disse numa vila que tem muito oferecer.
E o que aqui denunciei é uma extrema preocupação em tentar mudar um pouco as desigualdades agravantes que nos deparamos da cidade para as suas freguesias. Muitas vezes, associamos desertificação e retrocessso de mentalidades ao Alentejo, a Trás-os-Montes, ao Algarve no Inverno, quando essas disparidades também acontecem perto de nós. Grandes áreas metropolitanas como Porto e Lisboa apresentam fortes contrastes da cidade-centro para as periferias, e até mesmo os nossos concelhos. Como te disse, Santo Tirso está bem pior que Guimarães. Guimarães cidade está muito bem e recomendasse, de facto. As freguesias de Guimarães, Santo Tirso, Famalicão, etc. não estão assim tão bem.
E culpo sobretudo o poder autárquico que só se preocupa com o crescimento e desenvolvimento da cidade e deixa ao esquecimento as freguesias, inacessíveis, pobres económica, cultural e socialmente. Infelizmente o planeamento e desenvolvimento é pensado sobretudo para as cidades, as freguesias e suas populações são deixadas ao abandono e ao esquecimento. Penso que concordarás comigo!
Por outro lado, denuncio em parte as populações porque se recusam, muitas vezes, em acompanhar a mudança. Não vêem nela benefícios, preferindo ficar como estão. Também censuro um pouco isso. É necessária mobilização!
Daí eu ter falado muito em Serzedelo (que considero um pouco o fim do mundo)porque vejo em alguns familiares meus e vizinhos, uma certa resistência à mudança e limitam-se à sua mentalidade de anos e anos atrás. É uma vila muito, muito diferente da minha. E quando falo em relações de vizinhança não falo de coscuvilhice, falo de uma relação de proximidade e quase familiariedade, onde todos se conhecem. Algo que não acontece na cidade onde predominam relações de superficilidade e distanciamneto. Não menosprezo as primeiras relativamente às segundas.
Concordo quando dizes que as diferenças geográficas, culturais e sociais que possuímos enriquece e determina a identidade do nosso país. Mas nada do que eu disse invalida isso...

Espero ter-me feito entender!
Quanto ao convite para visitar Airão, talvez um dia me possas apresentar as suas marcas identitárias.

Até lá, um abraço!

Anónimo disse...

Cara Helena,

Confesso que só agora li o seu post. Concordo plenamente com o que escreveu e gostaria só de acrescentar um aspecto que julgo influente no estado das coisas. Falo da planificação territorial que, para não fugir à boa maneira lusitana, vive à lei da balda! A unica planificação territorial verdadeiramente vigente em Portugal é a municipal, e dentro desta categoria os Planos de Pormenor e os Planos de Urbanização. Os Planos que consagram aspectos mais «dispiciendos» (na opinião dos políticos e do legislador) como os Planos nacionais de ordenamento e planeamento do terrítório e os sectoriais, encontram-se na boa-vonatade das câmaras (já que dispôe do poder de os alterar mediante ratificação governamental). Eis uma das razões porque as nossas cidades só crescem em cimento. Famalicão, por exemplo, não será mais uma «cidade sem história»?

Helena Antunes disse...

Concordo consigo Aristotélico, nomeadamente nessa visão em que revela que o ordenamento se consegue com a boa-vontade de algumas Câmaras, dado que não há grande articulação entre poder central e poder local.
Veja um texo que aqui escrevi sobre desenvolvimento sustentável (http://sociologavense.blogspot.com/2007/07/importncia-de-garantirmos-um.html)onde falo um pouco de planeamento territorial.

Além do PP e do PU, penso que se terá esquecido daquele que, a nível municipal, têm vindo a ter maior preponderância: o PDM (Plano Director Municipal).

Quanto a Famalicão, não conheço tão bem como Santo Tirso, Guimarães ou até Braga, mas caso o Aristotélico queira poderá falar aqui um pouco.
Tenho amigas de Famalicão que se queixam e criticam de forma negativa a gestão autárquica de Armindo Costa. Já a mim, que estou de fora, parece-me que ele tem contribuído para o crescimento e desenvolvimento da cidade.

Cumprimentos.

Anónimo disse...

Cara Helena,

A partir do momento em que falamos de desertificação e em subdesenvolvimento, creio que começamos pela ponta do Iceberg para uma crítica mais geral,nomeadamente (e creio que estará melhor qualificada para falar sobre isso do que eu) a sociológica. É todo uma mentalidade de governantes e governados que urge reformar. As pessoas não têm consciência do que é a cidadania nem de como a exercer. Creio que é bem verdade para o nosso Vale do Ave.
Se quiser desenvolver o tema (que me parece já aflorado nos seus posts) aqui deixo o mote.

Cumprimentos

Se quiser dar uma olhadela em alguns textos de um bloger bastante mais preguiçoso que você: espasmosdamemoria.blogspot.com

Helena Antunes disse...

"É todo uma mentalidade de governantes e governados que urge reformar. As pessoas não têm consciência do que é a cidadania nem de como a exercer."

Caro Luciano, estou completamente de acordo consigo. E diria mais, as pessoas também demonstram pouca vontade em se mobilizar e exercer essa mesma cidadania.
Quanto à sua sugestão para desenvolver o tema, talvez mais tarde. Penso que aqui já fui deixando ideias muito importantes.

Obrigado pela sua visita ao blog.
Abraço.

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